23 de setembro de 2008

A crise da Bolívia e o gás no Brasil


A Bolívia está na iminência de uma guerra civil. Os departamentos (Estados) do chamado “Meia-Lua” (Santa Cruz, Pando, Beni e Tarija), por seu formato, onde a maioria é descendente de europeu e é contra o governo de Evo Morales.

Eleito democraticamente, Morales foi o primeiro presidente indígena da Bolívia e, ao invés de unir os brancos e índios de seu país, reforçou a diferença entre os dois. Também foi o primeiro presidente a entrar e implantar melhorias na favela Plán 3000, onde estão mais de 250 mil collas (índios). Construiu o primeiro hospital, a primeira universidade do local, o sistema de esgotos, escola, praça.

Os departamentos da “Meia-Lua” são chamados por Morales de separatistas, já que, para ele, esses departamentos querem se separar do resto do país. Já os governadores afirmam que são autonomistas, ou seja, querem maior autonomia sobre seu departamento, uma autonomia além do governo central.


O que desencadeou essa crise?
Para começar, dia 10 de Agosto, houve um referendo feito pelos aliados do Presidente, no qual este continuaria no poder, com mais de 67% dos votos. Ao longo deste ano, os departamentos da “Meia-Lua” fizeram votações que lhes concedia autonomia, mas não foi reconhecido pelo governo central. O presidente, então, para enfraquecer os autonomistas, retirou parte sobre o Imposto Direto sobre Hidrocarburetos, que é usado pelo governo para bancar o programa de previdência social.

Morales fez uma nova constituição, que é socialista e beneficia os indígenas. O imposto sobre o gás e o petróleo produzidos no país, mais especificamente em Santa Cruz, um dos departamentos opositores, deveria ir à La Paz, a capital. Os autonomistas discordam e acham que os impostos sobre as riquezas naturais devem pertencer ao departamento onde foi produzido.

Morales também propôs uma reforma agrária, onde a propriedade pode ter, no máximo, 10 mil hectares. Essa decisão afetaria a economia, já que os grandes produtores, que estão nos departamentos da “Meia-Lua”, utilizam mais do que isso para si.

Os governadores da “Meia-Lua” não reconheceram a nova constituição e boicotariam o referendo que seria feito para aprová-la em dezembro, já que essa nova constituição centraliza a figura do presidente, impedindo a autonomia dos departamentos e ameaçando os latifundiários de Santa Cruz.

Ódio racial
Os collas e os cambas (não índios) nunca se deram bem. Desde a colonização espanhola, onde os índios eram depreciados e os não índios tinham privilégios, por causa dessa oposição, eles já se odiavam. Até hoje existe esse ódio entre os collas e os cambas, como mostra a descrição feita por Andrés Gómes, um morador de Santa Cruz, anti-Evo Morales, ao descrever os moradores do Plán 3000: “São uma gente horrorosa. As collas [índias] fazem cocô nas ruas e se limpam nas próprias saias. O cheiro é horrível. É um povo de não-cristãos. Não compartilham conosco os valores ocidentais e o amor ao capitalismo”.

Os jovens da elite de Santa Cruz esperam escurecer para cercar a favela. Soltam rojões, sobrevoam o local, empunham paus, arremessam pedras. Para eles é “uma questão de honra vencer esses índios sujos que insistem em apoiar Morales”, como diz Carlos Ortiz, de 15 anos. Para atuar durante a noite, como soldado, o menino recebe 200 bolivianos, o equivalente a R$40,00.

O pior dos conflitos ocorridos foi em Pando, onde mais de 30 pessoas foram mortas. Os opositores também explodiram gasodutos, o que prejudica, por exemplo, o Brasil. Esperando a intervenção militar, os opositores querem criar o caos.

Intervenção militar
Na América do sul, quando se há um caos em algum país, os militares intervêm e aplicam uma ditadura, para acabar com os conflitos e fazer o país voltar a prosperar. Isso aconteceu em países como o Brasil, a Argentina e o Chile.

Dessa vez, não se sabe o porquê, os militares não reprimiram os protestantes e não protegeram as propriedades do governo, invadidas durante os protestos. Não se sabe se fizeram isso por decisão própria ou por um pedido de Morales.

Morales pediu para que, caso ocorresse algo com ele, a Venezuela poderia intervir na Bolívia, mas as forças armadas bolivianas são contra essa decisão.

Mediação internacional
Esse ódio racial é mais um fato que impede a possibilidade de um diálogo entre opositores e aliados à Evo Morales.

Para discutir o conflito, a presidente do Chile, Michelle Bachelet, convocou uma reunião da UNASUL (União das Nações Sul-Americanas) para os países da América do Sul definirem sua visão sobre o conflito.

Dessa reunião, a primeira em que a América do Sul se reúne para discutir os próprios problemas (sem interferência dos Estados Unidos), o grupo exige que Evo Morales cumpra seu mandato, já que foi eleito democraticamente; vai contra a separação dos departamentos da “Meia-Lua”, diz ser necessário o fim da violência e desocupação de Pando e a criação de uma comissão para ajudar no diálogo entre os opositores e o governo.

O governo brasileiro tentou enviar um grupo para mediar o diálogo, mas Morales afirmou que não havia necessidade de mediação estrangeira.

O Brasil
Apesar da fronteira brasileira ter sido bloqueada por manifestantes, os refugiados dos conflitos tentam fugir para as fronteiras no Brasil. Os fugitivos de Pando tentam ir para o Acre, e os fugitivos de Santa Cruz tentam entrar pelo Mato Grosso. Já que a porta oficial está bloqueada para passagem de automóveis ou até a pé, os fugitivos se adentram por entre as fronteiras, entrando ilegalmente no país.

Cerca de 50% do gás brasileiro é fornecido pela Bolívia: o Brasil recebe 31 milhões de metros cúbicos de gás boliviano, e 75% do gás paulista é fornecido pela Bolívia. Na iminência de uma guerra civil, o Brasil poderia ser afetado com a falta de gás.

No dia 11 de setembro, o fornecimento de gás chegou a ser reduzido a metade por causa dos conflitos, mas depois foi retomado. Ainda corremos o perigo de os bolivianos cortarem totalmente o fornecimento de gás para o exterior, o que prejudicaria extremamente o Brasil.